quinta-feira, 31 de maio de 2012

VERBO NEGADO


















Nunca te falei das aves do céu...
Por certo elas existem.
Eu as vejo, mas não as posso tocar.

Nunca te falei da aurora colorindo o horizonte...
Pintando com luzes o amanhecer...
Por certo ela existe,
embora os meus olhos teimem em se fechar.

Eu nunca te falei dos meus sonhos...
Nem tão alegres, nem tão tristes...
Por certo eles existem,
ainda que só eu saiba...

Eu nunca te falei do tudo... do nada...
Dos vazios em noites intermináveis,
de todas as coisas que por certo existem,
sem ao menos eu ter lhe falado...


Fabiana Gusmão


SEGREDOS DA LUA



















Na carne alva, branca tez.
Cada linha traçada à língua,
teu segredo mais guardado,
só tú sabes onde está.

Um corpo arquejante
retido na memória,
das entranhas onde moras.
Por quem pulsas, afinal?

Olhaste nos olhos e viste,
só não soubeste ler.
De ler, só leste a figura nua
entregue aos desejos teus.

Mas quem estava nua?
Não era ela, era a Lua.
Tu a viste, tu bem sabes...
Era dela, da lua,
a voz, a tez, a luz tua!

Fabiana Gusmão

terça-feira, 29 de maio de 2012

JURA DE AMOR DESFEITO















Nunca mais
quero olhar teus olhos oblíquos,
que jamais se dignaram
a olhar nos meus

Nem beijar tua boca infame
que morde e assopra,
que mente e profana
sem pudor algum.

Deletei um programa inteiro
cá dentro, no fundo de mim.
Desfiz os laços de amor estéril,
que não se fizeram, enfim.

Fiz teu enterro: Cortejo solene!
Sem nenhuma lágrima ressentida.
Cobri de flores um túmulo vazio,
lápide oca de qualquer bem querer.

Fechei a porta sem olhar para trás.
Nunca mais quero ouvir tua voz...
Nunca mais!

Fabiana Gusmão

DESPAUTÉRIO
















Não sei rimar coisa alguma.
Enxergo detrásprafrente
e escrevo delápracá.

Desconheço rapapés da língua.
Ocultaram-me a norma culta.
Escrevo, mas de revés.

Ignoro as convenções.
Convenciono-me à liberdade de ser.
E o resto é coisa quepoucomedá!

Fabiana Gusmão

POEMA INDECISO


Eu não sei, não sei...
não sei
se vou,
se fico;
se deixo,
ou se beijo;
se não falo,
ou se grito;
se te amo,
ou adeus!
Não sei
se calo e consinto,
se me nego... se me nego...
Se fecho os olhos,
se finjo;
se não vejo,
ou não sinto...
Daquilo que me silencia,
que me fere,
vazio de não saber...

Fabiana Gusmão

segunda-feira, 28 de maio de 2012

MENINO
















Um pé de vento
varreu o mundo;
pé de menino,
fundo sem fundo.

Na teimosia
de ser diferente,
menino, mais alma que gente,
pensamento na contramão.

Cismou de andar
em caminhos além,
de onde brotam os sonhos,
onde o amor lhe convém...

Repousa à noite
entre anjos e flores;
e de dia, refeito,
vai à busca do sol.

Fabiana Gusmão

VERSOS ÍNTIMOS



Não percas teu tempo
precioso... impreciso,
fazendo do verso
um reverso sem forma...
Convido-te:
Vem e pinta em mim tua história.
A mesma pena que corre na pauta,
Escorre em mim teus segredos...
- Eu posso ler! –
E, ainda que insistas no inverso,
a poesia, tua figura íntima,
está inscrita no gesto.

Fabiana Gusmão