quarta-feira, 19 de outubro de 2016

MENINA POESIA

Nandinha pequenina.

A menina era bem pequenina
E vivia a brincar pelo chão.
Sorriso doce, olhar altivo,
Mil segredos na imaginação...

Suas maçãs, sempre rosadas,
matizavam, no centro, a tez;
e ao lado das curvas dos lábios,
as covinhas da insensatez.

(Preferia a solidão
À certa companhia
Preferia o silêncio,
À palavra vazia...)

Deixou a arte crescer,
No silêncio da sua solidão;
Escorreu entre os seus pensamentos,
Brotou da palma da mão.

No azul do céu, desenhou
Correu, livre, entre as árvores
rabiscou seus desejos alegres
Na areia alva, que a chuva lavou.

Um dia desistiu de ser gente,
vestida em poeira e fantasia
disse-me alegre, sorrindo:
- Decidi, vou ser poesia!


Fabiana Gusmão

terça-feira, 18 de outubro de 2016

INVERSO

Imagem registrada pela própria autora em Porto Seguro, BA.
Quando me calo, grito.
Quando lhe mato, morro.
Quando lhe falo, aflito,
Na palavra escorro.

O meu olhar repleto,
Meu andar ostenta.
O meu sonhar secreto,
Minha dor sustenta.

E se choro, canto,
E em meu canto, existo.
Se lamento em pranto,
Já não mais insisto.

Meu corpo labuta,
Nessa lida santa.
Meu sorriso oculta,
O que a alma espanta.

E de verso inverso,
Desfaço o caminho.
Se não vou, regresso,
Impávido ao ninho.


Fabiana Gusmão Rocha




terça-feira, 4 de outubro de 2016

PRONOMES CRUZADOS














(Do meu lado), era eu,
Solitária em meu mundo,
(Do outro lado), você,
Um oceano sem fundo.

Eu, sendo amada na primeira pessoa.
Tu, na segunda, vivendo à toa.

Sabendo-me uno
E sabendo-te a sós...
Cruzados caminhos,
Tornaram-nos nós.


Fabiana Gusmão, 29 de setembro de 2016

O TEU OLHAR


terça-feira, 13 de setembro de 2016

CHISTE


Imagem do google.
Um poema escarnecido, um poema mau humorado
Já vi coisa feia nessa vida
Sei que no mundo, tudo há
Até no beiço do jegue, a ferida
O dono lamber, a praguejar

Já vi a moça desdentada e feia
Vesga por fora e troncha por dentro
Vestir-se de zebra e coleira
E desfilar mal pintada no centro

Já vi coisa feia nessa vida
E sei que muitas hei de ver
Mas por último, dei de testa com o que possa parecer...

E perecia...

Parecia que era algo que não me cabe definir
Como se, de repente, um Górgonas se pusesse a parir
Parecia que era noite e o cão a praguejar
Cerrando os dentes, rosnasse cantigas de ninar
E o dragão abrisse as ventas, sorrindo largamente
Desejando, de vestido, a proeza de ser gente
Parecia que era cólica, dor de quase morrer
A boca que abre e grunhe, mas sem nada a dizer!
Já vi coisa feia nessa vida
E sei que ainda hei de ver...


Fabiana Gusmão, 26 de junho de 2016.

Poema em silêncio












Eu fiz um poema silencioso,
sem vez, sem mácula e sem voz.
Discreto, tímido, orgulhoso;
mas, sem palpite em vós

Calado por gosto,
escondido por bem;
morrerá em seu posto,
não verá a ninguém.

Eu fiz um poema jocoso,
poucos o compreenderiam;
em seu verso sinuoso,
muitos sucumbiriam.

Tímido, discreto, calado;
meu poema prefere morrer,
em silêncio completo e profundo,
à sombra do verbo esquecer.

Fabiana Gusmão


segunda-feira, 5 de setembro de 2016

DESMEDIDA
















Já não cabe em mim
Esse poema encarnado.
As letras, as linhas,
Já não cabem mais.

Já não visto esta roupa
Que outrora bem vestia.
Ora me sobra, ora me falta,
Estranha desarmonia.

Já não ouço as canções
Que o vento tocava;
Ouço a brisa de agora,
Que de longe soprava.

Já não caibo em meu próprio verso,
Já não caibo em minhas vestes,
Já não cabes cá dentro,
Onde antes coubestes.

Fabiana Gusmão 




segunda-feira, 29 de agosto de 2016

ODE AO RISO

Imagem do google


O riso que vês agora
Como um rio que deságua
De dentro pra fora
E brota do fundo de mim.

É um riso de aves brejeiras,
Insignes pelo céu anil,
Voando alegres, sorrateiras,
Ao longe, além e sem fim.

Como as flores mais singelas,
Que brotam despretensiosas
Em alamedas, nas janelas,
Dos olhos de quem me conduz.

Como fonte de águas claras,
Ladeando a enseada;
Borboletas na beira da estrada;
Todo amor, toda cor e toda luz.


Fabiana Gusmão

segunda-feira, 8 de agosto de 2016

SOBRE SONHOS















Sonhei que era uma gota d’água,
No oceano sem fim do seu olhar...
E nele, mergulhada,
Ansiava por te encontrar.

Sonhei que era um facho de luz,
Na suavidade inebriante do luar...
E nele, enluarada,
Repleta do meu sonhar.

Sonhei que era um sonho lindo,
Repousado nos braços de Morfeu...
E nele, enamorada,
Caminhava ao lado teu.

Sonhei que era um pássaro livre,
Na imensidão do céu a voar...
E nele, suavemente,
Fiz meus sonhos descansar.


Fabiana Rocha

quarta-feira, 27 de julho de 2016

ANEDÓTICA


Complexo demais...
Só eu posso ser eu!

Nenhum remendo
Mal remendado,
Nenhum reboco
Mal rebocado.

Nenhuma palavra
Mal arranjada,
Nenhuma poesia
Mal versejada.

Nenhuma alegria
Desenxabida,
Nem a simpatia
Esbaforida.

O arremedo é só anedota.
Não cabe na forma, não passa na porta!

Fabiana Gusmão, 27 de julho de 2016.


terça-feira, 26 de julho de 2016

ETERNA NUDEZ


-  Criador das coisas belas
(e dos homens vis)! -

Livrai-me das almas insossas
Da incoerência,
Das insipiências,
E da sensatez.

Livrai-me da neutralidade,
Das dúbias verdades,
Da hedionda tragédia
Da desfaçatez.

Livrai-me, por piedade,
Do sorriso sem alma,
Da palavra oca,
Dessa lucidez.

E, se não for mal rogado,
O pedido infame
E essa má criação:
Fazei-me escorrer entre as letras,
Vestir poesia,
Eterna nudez!

Fabiana Gusmão, 26 de julho de 2016




segunda-feira, 25 de julho de 2016

ESSE LAÇO













Esse laço de agora,
Refeito e afeito,
Que aqui se demora,
Arremata-me o peito.

Ata-me os sonhos
Nas noites felizes.
Rostinhos risonhos,
Rosadas matizes.

E esse laço de afeto,
Suave e sereno,
É o meu mais secreto
E doce veneno.

Detém-me amorosa
Em dias de paz
Harmonia precisa
N’onde a vida se faz!


Fabiana Gusmão, 25 de julho de 2016.

terça-feira, 28 de junho de 2016

ASSIM, A POESIA

























Desfiz um poema em segredo
Corrompi a singularidade do eu
Refiz outra coisa qualquer
Nem nosso, nem vosso, nem teu.

Corri a caneta entre uns versos
Pintei-os de azul-cor-de-mar
Desatei-lhes os nós pelos pés
Revesti-lhes de asas a voar

Nascida, esculpida e aluada
Assim reinventei a poesia
Perene fluir de sonhos
O sal, o sol, o pão de cada dia.


Fabiana Gusmão, em 26 de junho de 2016

segunda-feira, 27 de junho de 2016

AOS DOIS ELEMENTOS

Imagem do Google. 


















Pelo sol que agora inunda
Cada fresta amanhecida em mim.
Pela vida que agora excede
Sem princípio, nem meio, nem fim.

Pela água da qual viestes
E dela tudo faz brotar.
Pela indefinível força que exalo
Não podes ver, sentir, nem tocar.

Pelo zelo do amor de amante
Que de longe com os olhos toca.
Pela insondável magnitude da alma
Que aos vazios e rasos sufoca.

Oração aos dois elementos:

Para que não te iguales aos tolos do mundo
Num poço de nada, num fundo sem fundo...

Fabiana Gusmão, em 26 de junho de 2016

terça-feira, 21 de junho de 2016

RESPOSTA

Foto tirada em Serra Grande, BA, em 01/2015.
















- Daqui, de onde te ouço gritar,
tua voz fascina, tal qual o mar!

Assim sussurrou a moça atrevida.

Não era nada novo, bem sabia;
só uns versos eternizados,
agora entranhados,
de quem fora seu, um dia.

- Um amor assim, não finda,
posto que ama, só por amar!


Fabiana Gusmão, em 21 de junho de 2016

sexta-feira, 17 de junho de 2016

SEGREDO À CANÇÃO

Imagem feita no jardim de casa
















Pequena ave sem ninho,
Terna flor sem espinho,
Perfuma teu céu e teu ar.

O beijo roubado no tempo,
A brisa reinventando o vento,
Rodopios em seu caminhar.

O cheiro da terra molhada,
A noite, enamorada
Do sol no alvorecer.

As ondas, na areia deitando,
Fios de luar derramando,
Clareando teu amanhecer.

O verbo riscado em segredo,
O poema escorrido no dedo, 
Acordes de tua canção.   

Fabiana Gusmão, reflexão em 18/02/16

SEM NOME

Imagem do Cemitério do Kadija, localizado
 na periferia do município de Vitória da Conquista - BA.


















Lá fora, onde ruge o vento,
Gente sem dono, sem documento,
Range os dentes, num gemido mudo.
Silencioso gemido de medo e de dor.

Sobe o morro, desce às baixadas;
Vem ver de perto as cruzes fincadas;
Curtas histórias sem fim.
Vidas ceifadas sem clamor.

Chega mais perto, toque a fronte,
Eis a mulher que perdeu seu infante
Cujo sono outrora embalava...
Cujo corpo, sem vida, ora embala.
.............
Ninguém a escuta, ninguém a vê;
Recolhe o menino sozinha;
Sussurra-lhe: a bala, nem doce, nem perdida...
Conta-lhe em segredo todos os sonhos,
Que partiu sem sequer sonhar.
E leva-o, amparado em seus braços,
Uma última vez, enfim!

Fabiana Gusmão, reflexão em 18 fevereiro de 2016.


terça-feira, 14 de junho de 2016

DESEJO

Mirante da cidade histórica, em Porto Seguro, BA. Nov/2016














Entre todas as coisas que existem;
E do que resta agora, apenas peço:
Deixa que eu simplesmente seja
O avesso do avesso, um verso.

Em letras de rubor escarlate,
Nas folhas opacas do tempo.
Deixa-me perder entre as horas,
Bailando nesse pensamento.

Quero ser ave, ser flor
e beijar a face do céu.
Poder caminhar nas alturas,
Escrever meu destino ao léu.

E repousar suave, alegre... assim,
Dona do vento, inventando as horas, sem fim.

Fabiana Gusmão, junho de 2016